Há dois problemas fundamentais: em primeiro lugar, ninguém tem uma ideia segura sobre as determinantes do preço do petróleo; em segundo lugar, não é só o nível de preço que importa — é também a variabilidade.
A estabilidade verificada no preço do petróleo durante a maior parte da década de 90 (entre os 20 e os 30 dólares) era o resultado de um processo de determinação do lado da oferta, pelo cartel que controla boa parte da produção petrolífera mundial. A OPEP conseguia determinar e sustentar o preço do petróleo por uma razão simples: dispunha de uma considerável capacidade excedentária relativamente à procura mundial.
Nos últimos anos, o mercado alterou-se de forma muito significativa do lado da procura. Numa palavra: China. O rápido crescimento económico chinês em particular e asiático em geral provocou um deslocamento da curva da procura de petróleo. O excesso de capacidade da OPEP foi desaparecendo à medida que aumentos de produção eram decididos pelo cartel para fazer face à procura crescente. De acordo com o Economist (edição de 2 de Dezembro), a capacidade excedente instalada atingiu o mínimo absoluto dos últimos vinte anos. O resultado dos sucessivos excessos de procura foi uma tendência temporal crescente do preço do petróleo.
Mas a flutuação em torno da tendência tem outra explicação: o risco geopolítico. O principal problema do petróleo não é a escassez, é o risco de súbitas e brutais quebras de produção. É aqui que o terrorismo islâmico entra em cena. A Arábia Saudita é o pais decisivo, pela dimensão das suas reservas petrolíferas e a Casa de Saud é o verdadeiro alvo dos jihadistas. A melhor forma de instabilizar a Arábia Saudita é através de ataques às instalações de produção e transporte de petróleo. Segundo fontes citada no artigo do Economist, o prémio de risco incorporado no preço corrente do barril de petróleo poderá ser de 10 a 15 dólares (a expectativa de preços futuros mais elevados aumenta a procura corrente). As expansões de capacidade levam tempo a produzir efeitos e também são alvos para os terroristas.
As alternativas à Arábia Saudita não são brilhantes: o Iraque, a Venezuela, a Nigéria e a Rússia não são propriamente exemplos de estabilidade política. É certo que os países europeus estão hoje menos vulneráveis a flutuações bruscas no preço do petróleo do que na década de 1970: a despesa com o petróleo (em % do PIB) diminuiu para cerca de metade do valor de então, o que produziu um substancial “efeito de rendimento” positivo (associado à baixa do preço do petróleo durante a década de 90). A transmissão de eventuais subidas do preço do petróleo à taxa de inflação é muito menos provável com o euro. Mas o World Economic Outlook da OCDE recentemente lançado dedica um capítulo inteiro ao preço do petróleo (só na press release, a palavra “petróleo” é mencionada por vinte e cinco vezes em duas páginas). Se não há verdadeiramente um “problema” com o preço do petróleo, porquê tanta atenção?
Talvez a resposta seja: não há um problema macroeconómico “imediato” mas haverá a médio prazo. Se a tendência crescente do preço do petróleo se mantiver, inevitavelmente transmitir-se-á ao nível geral de preços e as economias que tiverem desequilíbrios macroeconómicos graves, como uma poupança pública sistematicamente negativa, estarão na primeira linha das dificuldades. O aviso (caso fosse necessário) é claro: o risco geopolítico é hoje maior do que nunca e agentes económicos racionais devem reagir ao aumento de risco adquirindo “seguros”. O governo português não tem de reduzir a despesa pública para “parecer bem na fotografia de Bruxelas”: tem de o fazer se quiser evitar que Portugal mude daqui por uns anos o nome para Nova Argentina.
Se os portugueses se convencerem que devem votar nas próximas eleições contra “austeridades e rigores desnecessários” será de uma irresponsabilidade política a raiar a loucura.
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