2004-12-22

Os capitalistas cautelosos

Sugestão de leitura: “Cautious Capitalists”, de Robert J. Samuelson, no Washington Post de hoje. Alguns excertos:

“Since their recent low in late 2001, after-tax corporate profits have surged by more than 70 percent; but business investment — in new computers, software, machinery and buildings — has revived only modestly, increasing about 18 percent. Capitalism isn't supposed to work this way. Soaring profits usually signal new investment opportunities and provide the cash to exploit them. Indisputably, cash is plentiful. (…)

The disconnect reflects a sea change in corporate psychology. Call it the return of "risk aversion" (…).Everything has changed. The business cycle endures; stocks fall; globalization is hazardous (i.e. terrorism and high oil prices); the Internet is unnerving; CEOs are felons. Greater profitability does not, in this climate, automatically become a springboard for action. Companies are not entirely immobilized. But there are higher hurdles, both psychologically and financially, for undertaking new expansions or hiring lots of new workers. (…)

There are two ways to look at the new "risk aversion." One is that it's healthy. Everyone realizes that the wild spending of the late 1990s was wasteful. Why invest more when many industries still have surplus capacity? (…)

The other possibility is that it's a potential calamity. It sacrifices future growth for present profits and leaves the recovery too dependent on strong consumer spending. Of these possibilities, conventional wisdom favors the first. In 2005 the economy is expected to continue a solid if unspectacular advance. In reality we don't know. Psychology is much underrated as an economic driving force, precisely because it's so hard to measure. In the late 1990s the prevailing euphoria became self-fulfilling — disastrously so. Now corporate caution could become self-fulfilling in the opposite way. That's not a certainty, but it is a risk.”
O artigo de Robert J. Samuelson sugere que o crescimento económico americano está dependente do crescimento do consumo e não do investimento (que aumentaria o rendimento permanente no futuro). Um desequilíbrio da balança corrente, mesmo um grande desequilíbrio, como no caso americano não é necessariamente um "problema". Uma das coisas que torna esse desequilíbrio preocupante é a sugestão quanto à composição das importações. Outro motivo de preocupação é a alteração na composição das balanças de capitais e financeira americana nos anos mais recentes (veja-se este excelente artigo do Economist).

Em termos agregados, os EUA são um (enorme) devedor líquido, ao contrário da “zona euro”, que é credora líquida (se existissem apenas devedores líquidos algo estaria “seriamente errado” em termos agregados...). A “tentação” de desvalorização cambial para o governo americano é grande e poderá resultar na perda pelo dólar do estatuto de reserva de valor: não são poucos nem secundários os bancos centrais que estão a reduzir as suas posições de reservas em dólares. Um dólar desvalorizado não é uma boa notícia (pelo menos no curto prazo) para as economias da "zona euro", mas as alternativas a que o governo americano poderá recorrer são ainda piores (por exemplo, a utilização de medidas, mais ou menos sofisticadas, de proteccionismo).

Já anteriormente se chamou a atenção para o aumento do risco geopolítico causado pelo terrorismo jihadista. A resolução dos problemas da economia americana poderá implicar alterações profundas do sistema financeiro internacional, o que também aumenta a percepção do risco. Quando “capitalistas” e bancos centrais se comportam de forma “cautelosa”, isso deve ser interpretado como “sinal de perigo” pelos restantes agentes económicos e decisores políticos: em 2005 poderá vir a concretizar-se um “estado de coisas” economicamente adverso. No entanto Robert J. Samuelson sublinha também que se a generalidade dos agentes económicos agirem de acordo com essa expectativa “negativa” , então isso poderá tornar-se numa espécie de “profecia auto-realizante”, fazendo com que 2005 seja de facto um ano de dificuldades económicas.

Independentemente da conjuntura externa em 2005, em Portugal continuará certamente a vigorar a “regra de ouro” da política nacional: os responsáveis estarão sempre demasiadamente longe e os irresponsáveis perigosamente perto.

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