2003-05-28

Mais contributos para a discussão Ao cuidado da Associação Protectora do Prof. João César das Neves.

Diz Valete Frates!, na entrada de 14 de Maio que fez o favor de me enviar, que "[...] César das Neves tem toda a liberdade de manifestar os seus pontos de vista e de actuar de acordo com a sua consciência, da mesma forma que os activistas homossexuais o fazem [...]" e ainda que "[...] as opiniões de César das Neves têm especial valor porque dão voz a uma opinião que normalmente é abafada pelo politicamente correcto". Concordo inteiramente. Não concordo muitas vezes com as opiniões de César das Neves, mas não há dúvida que a polémica que elas levantam é saudável.

Diz ainda que "o critério de moralidade apresentado pelo Picuinhas é o seguinte: 'são morais todos os comportamentos livremente consentidos, desde que os intervenientes sejam maiores e estejam na posse de todas as suas faculdades'". Não anda longe da verdade. Mas falta o essencial: a liberdade e os direitos de terceiros não podem ser afectados. É uma pequena diferença que faz toda a diferença. Daí que não se possa concluir que "por exemplo, assassinar e roubar são pecados de acordo com os dois critérios; cobiçar o conjuge ou os bens de outrém não é pecado de acordo com o primeiro critério [o meu], mas é pecado de acordo o segundo critério [o de César das Neves]". De facto, ambos são errados de acordo com o critério que apresentei, que de resto não quero apresentar como definitivo, note-se.

Valete Frates! levanta depois uma questão interessante, a que não sei responder cabalmente. Sugere ele que "aquilo que o Picuinhas considera ser um critério de moralidade é, na realidade, um critério de "legalidade" (de "justa conduta", de "interacção pacífica"); deveria ser um dos princípios utilizados para definir o que é uma intervenção legítima das autoridades responsáveis pela manutenção da segurança pública e para a condenação de determinados actos em juízo". Mas a verdade é que a legalidade se deve basear num consenso moral, num menor múltiplo comum (ou talvez um pouco mais) das sensibilidades morais de um povo, auscultadas normalmente de forma indirecta através da eleição de assembleias legislativas, e ocasionalmente através da democracia directa do referendo. Assim, os critérios de legalidade reflectem uma moral subjacente. Daí que me pareça que, se o critério que apresentei pode ser usado para definir um critério geral de legalidade, é também porque pode ser visto como um critério mínimo de moralidade. É evidente que é um critério "mínimo". É isso que deixa latitude aos católicos para recorrer a critérios mais apertados, desde que o seu exercício não viole a lei. É por isso, talvez, que a a igreja condena a homossexualidade, mas aceita os homossexuais. Sinais dos tempos e do aggiornamento.

Quanto à relação destas questões com o Liberalismo Clássico, confesso que não sei o suficiente para me pronunciar. Talvez mais tarde, quem sabe.

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