2003-02-22

Em Not in My Name, na Visão, Eduardo Lourenço diz:

É difícil conceber um cenário mais anacrónico e aberrante do que este, em vias de se converter, na praça pública – aos olhos de alguns europeus e de muitos americanos – em confronto entre uma Europa que não existe politicamente e uns Estados Unidos que existem superlativamente. Nem eles parecem saber quanto. Se o soubessem, não se mobilizariam para cruzadas absurdas, ofensivas da legalidade internacional de que os Estados Unidos são o pilar essencial e pleonástico, pois eles já estão onde querem chegar. E, antes de mais, na nossa querida e velha Europa, não só por lá terem desembarcado duas vezes em menos de meio século, para nos «salvar», mas por dentro, como objecto de admiração extasiada pelo que são como inventores e distribuidores dos «gadgets» míticos da nossa civilização. Ou, com mais propriedade, como suportes da mitologia dessa mesma civilização.


Sim. "Gadgets". Como o computador, por exemplo. Ou o transístor. Ou o circuito integrado. Ou o sequenciamento do genoma humano. Ou boa parte dos nosso fármacos. Ou a maior produção científica mundial. Tudo "gadgets" sem importância. Aliás, não li Eduardo Lourenço na Internet, usando o meu computador, cujas tecnologias nasceram quase todas do outro lado do atlântico.

Mais à frente:
Europeus e americanos fazem parte da mesma e única aventura colonizadora e imperialista ocidental, nós como desempregados dela à força, e eles, seus herdeiros ainda convencidos, e não sem sólidas razões (como foram em tempos as nossas) de que o género de vida que inventaram e o paradigma democrático que a sublima convêm ao mundo inteiro. Daí não viria mal ao mundo, se dessa vocação missionária e messiânica não tivessem passado à tentação demoníaca de a querer impor à força ao mundo inteiro. É aqui que aparece o antiamericanismo, que é só a clara e determinada recusa dessa pretensão. Americanos, sim, mas devagar...


Excelente questão. Se o paradigma democrático não convém ao mundo inteiro, porque vive Eduardo Lourenço no Ocidente? Porquê a imigração para o Ocidente? A declaração universal dos direitos do homem não é suposto ser universal? Quanto a imposições, será uma imposição libertar os Iraquianos de Saddam, ou a Coreia do Norte de Kim Yong-Il? Os EUA conseguiram libertar o mundo do comunismo soviético, sem que tenha havido um confronto directo com a União Soviética. Seria preferível que o mesmo acontecesse relativamente ao Iraque e à Coreia do Norte, mas talvez não seja muito justo fazer os iraquianos e os coreanos esperar tanto tempo quanto esperaram as populações do Leste. Recordo os momentos iniciais de "O Pianista", quando o chefe de família dizia que a Inglaterra e a França os libertaria, logo que entrassem na guerra. Ironia do destino... Quem os "libertou" foi a União Soviética. Quase cinquenta anos foi quanto demoraram a libertar-se dessa "liberdade". Hoje, os países de Leste estão com os EUA, evidentemente. Só a cegueira da nossa esquerda a impede de perceber porquê.

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