2005-01-10

Todos somos vítimas

O presidente francês Jacques Chirac voltou a insistir na ideia do lançamento de um "imposto internacional" para "auxiliar as vítimas do maremoto no sudeste asiático". Sem especificar a natureza, base fiscal e carácter (temporário ou permanente) deste imposto, o Sr. Chirac pretende ainda assim que a sua "proposta" seja aprovada pelo G7+1. Várias hipóteses são possíveis:

1. O Sr. Chirac pretende restringir a colecta deste "imposto" aos países que pouco ou nada têm ajudado a reunir recursos humanos e materiais para auxiliar no alívio do sofrimento humano causado pelo maremoto. Principais países a tributar: França, China, Rússia, Arábia Saudita e quase todos os outros países árabes, Indonésia, Tailândia e Sri Lanka.

2. O Sr. Chirac refere-se apenas a uma operação de contabilidade internacional através da qual os orçamentos das organizações não governamentais (NGO’s) serão drasticamente reduzidos, a título de "imposto", do custo das operações humanitárias em curso no sudeste asiático. A medida incidirá particularmente sobre as agências dependentes da ONU, que distribuem mais propaganda política do que alimentos e medicamentos, como é o caso da UNICEF. Os beneficiários serão os países que contribuem para sustentar financeiramente as NGO’s na proporção em que têm ajudado as vítimas do maremoto, ou seja: essencialmente os EUA e a Austrália —verdadeiros campeões da ajuda humanitária unilateral. A medida tem ampla justificação na necessidade de reduzir os inacreditáveis gastos sumptuários das NGO's e canalizar os dinheiros nelas desperdiçados para finalidades mais urgentes e importantes, como o alívio do sofrimento humano nas suas formas extremas. Neste caso não vejo grande dificuldade em conseguir a anuência do G7 perante uma medida do mais elementar bom senso e sentido ético.

3. O Sr. Chirac não ignora que o lançamento de impostos é uma prerrogativa de soberania e aproveita a desgraça alheia para, com um cinismo repugnante, forçar o avanço de uma agenda política internacionalista, sempre orientada pela obsessão patética e demencial de colocar a França no centro da "construção" de um fictício contra-poder americano. Tudo serve e todos somos vítimas —não do maremoto asiático mas da megalomania neo-gaullista.

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